Para o Editor:
Um rapaz de 13 anos, sem historial médico, que praticava futebol, precisou de uma consulta após súbitas mortes de jogadores profissionais de futebol relatadas na imprensa. Ele estava assintomático. O exame físico e ECG foram normais. O ecocardiograma trans torácico (ETT) mostrou origem anômala da artéria coronária direita do seio anterior esquerdo com curso oblíquo entre a aorta e o tronco da artéria pulmonar (Figura 1, Painel A) confirmada por uma angiografia coronária multislice (Figura 1, Painéis B e C). Holter-ECG, ECG de estresse e ecocardiograma de estresse foram normais. A perfusão miocárdica de esforço provocou uma isquemia moderada em território inferior (Figura 1, Painel D). Foi realizada correção cirúrgica com reimplante da artéria coronária direita. O período peri-operatório foi sem intercorrências. Três meses após a cirurgia, o TTE mostrou um óstio neocoronariano desobstruído (Figura 2, Painel A) e a perfusão miocárdica de esforço não mostrou isquemia miocárdica (Figura 2, Painel B).
Figura 1. Origem anômala da artéria coronária direita do seio anterior esquerdo com curso oblíquo entre a aorta e o tronco da artéria pulmonar visualizada pelo ecocardiograma trans torácico (Painel A, seta azul). A angiografia coronária por TC multislice permitiu uma definição mais definitiva da angulação coronária e curso (painel B e painel C, seta azul). A perfusão miocárdica (sob estresse e em repouso) identificou isquemia moderada em território inferior, região suprida pela artéria coronária direita (painel D). Ao: aorta; Pa: tronco da artéria pulmonar.
Figura 2. Três meses após a cirurgia, o ecocardiograma transtorácico mostrou um óstio neocoronariano desobstruído demonstrado pelo mapeamento colorido do fluxo mostrando fluxo na artéria coronária proximal direita (Painel A, seta azul). A perfusão miocárdica (sob estresse e em repouso) não mostrou isquemia miocárdica (Painel B). Ao: aorta; Pa: tronco da artéria pulmonar.
Compressão da artéria coronária anômala entre a aorta e o tronco da artéria pulmonar, fechamento do orifício coronário tipo fenda ou vasoespasmo pode explicar a isquemia miocárdica e morte súbita em pacientes com artéria coronária anômala decorrente do seio errado. A triagem habitual não conseguiu identificar pacientes com risco de morte súbita.1 A delineação anatômica do curso de uma artéria coronária entre os grandes vasos continua sendo o maior risco conhecido de um evento adverso. O TTE é o exame de primeira escolha, com visualização correta dos óstios em 90% dos casos. A angiografia coronária por TC multislice ou angiografia por ressonância magnética é recomendada para melhorar a análise do curso coronariano.
A correção cirúrgica e alguns casos de angioplastia com stent têm sido relatados como tendo confiabilidade a curto prazo, sem seguimento a longo prazo. Ampla experiência clínica de correção cirúrgica nestes pacientes tem sido acumulada. A revascularização cirúrgica pode consistir em1 revascularização coronária1,1 reimplante coronário ectópico direto na raiz da aorta,2 desobstrução do segmento coronário intramural,3 ou criação de um novo óstio no final do segmento intramural da artéria ectópica4. Como os resultados em longo prazo da revascularização do miocárdio não são ideais (potencial necessidade de reintervenção, risco de fluxo sanguíneo competitivo na presença de artéria coronária ectópica desobstruída em repouso), procedimentos cirúrgicos alternativos são cada vez mais considerados como opções mais favoráveis em centros com expertise.2 O stent transcatheter do segmento intramural proximal tem sido aplicado com sucesso em adultos há uma década.3,4 A experiência continua muito limitada em crianças. Mesmo que a angioplastia com stent possa ser uma alternativa interessante à cirurgia cardíaca, é um procedimento muitas vezes tecnicamente complexo, com dificuldade de alcançar e canular o óstio da artéria ectópica. Além disso, o grau ideal de dilatação do stent permanece problemático e o tipo de stent (eluição de drogas ou stent padrão) não é estabelecido. O rastreamento ecocardiográfico de familiares de primeiro grau foi recentemente aconselhado após a descrição de uma ocorrência familiar de origem anômala da artéria coronária.5